A Lei Brasileira de Inclusão, lei federal n° 13.146/2015, também conhecida como Estatuto da Pessoa com Deficiência, é um importante mecanismo de conhecimento e defesa dos direitos da pessoa com deficiência, inclusive, já foi considerada uma das melhores leis do mundo na área da inclusão.
Mas, mesmo assim é preciso refletir sobre ela e como ela causa impacto na vida das pessoas com deficiência. É isso que a advogada Viviane Limongi se propõe no Livro “A Capacidade Civil e o Estatuto da Pessoa com Deficiência – reflexos patrimoniais decorrentes do negócio jurídico firmado pela pessoa com deficiência mental.”
O livro será lançado pela editora Lumen Juris, nesta quarta-feira (21), às 21h30, na Livraria da Vila – Piso superior. Localizada na Alameda Lorena, 1731 – Jardim Paulista- SP. Confira nossa entrevista com a autora:
1 - De onde veio a vontade de trabalhar com a temática da legislação específica para pessoa com deficiência?
(Viviane Limongi): A História mostra que, ao longo dos tempos, as pessoas com deficiência, principalmente as com deficiência mental e intelectual, foram vítimas de tratamentos degradantes e, de alguma forma, ficaram afastadas da sociedade. A expressão “loucos de todo gênero”, constante do Código Civil de 1916, sempre se mostrou preconceituosa e generalista, abrangendo desde as doenças mentais mais graves até pequenos nuances de deficiência mental leve. Essa expressão somente foi do ordenamento jurídico brasileiro em 2002, com a uma mudança do Código Civil, o que demonstra o estigma suportado pelas pessoas com deficiência no século passado.
Com o desenvolvimento dos direitos humanos, principalmente após meados do século passado e a mudança de algumas leis esparsas, vimos a evolução do ordenamento jurídico em prol da pessoa com deficiência, que acabou culminando com a aprovação da Lei Brasileira de Inclusão que hoje é um marco em favor dos direitos das pessoas com deficiência
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2- Como você construiu essa análise comparativa dos conceitos entre as duas legislações?
(Viviane Limongi): O livro trata da alteração do instituto da capacidade civil, antes e após a promulgação do Estatuto da Pessoa com Deficiência. Hoje, com a Lei Brasileira de Inclusão, há a presunção de capacidade para todos os atos da vida civil, bastando que a pessoa com deficiência consiga expressar seu consentimento para celebrar determinado negócio jurídico. Isso confirma sua capacidade e traz autonomia para gerir-se conforme suas conveniências e desejos.
3- Qual a sua avaliação da Lei Brasileira de Inclusão, quais seus pontos fortes e fracos?
(Viviane Limongi): A Lei Brasileira de Inclusão reconhece a pessoa com deficiência como “pessoa social”, incluindo-a na sociedade e confirmando sua autonomia e capacidade para exercer, por si, todos os atos na vida civil. É responsabilidade da sociedade diminuir os obstáculos para que a inclusão seja efetivada.
Antes, a pessoa com deficiência ficava limitada ao processo de interdição que – a despeito do que diz o novo Código de Processo Civil – não existe mais. O que existe hoje é uma curatela para certos atos negociais, mas em caso de divergência entre o curatelado e o curador, prevalece a vontade do curatelado. A confirmação da autonomia privada da pessoa com deficiência, em todos os atos da vida civil, é o grande avanço da LBI.
No entanto, o ponto fraco é a exclusão, pela Lei, da incapacidade absoluta por deficiência cognitiva grave. Antes, negócios jurídicos firmados por pessoa sem discernimento seriam acoimados com a pena da nulidade, ou seja, é como se eles nunca tivessem nascido para o mundo jurídico. Hoje, com a exclusão da possibilidade de incapacidade absoluta por deficiência grave, esses negócios jurídicos são apenas anuláveis e se podem convalescer com o tempo, o que pode se mostrar prejudicial à proteção da pessoa com deficiência.
4- Em termos de representação a LBI consegue garantir todos os direitos da pessoa com deficiência?
(Viviane Limongi): Ao modificar o artigo 3º do Código Civil e limitar a hipótese de incapacidade absoluta aos menores de 16 anos, a LBI retirou, por via transversa, a representação da pessoa que, por questões de saúde, não consegue expressar consentimento.
Isso é grave pois, eventualmente, uma pessoa doente precisará ser representada – e não meramente assistida – por alguém, para exercer os atos da vida civil.
Não se mudam os fatos. A pessoa com deficiência mental poderá demandar representação, sob pena de ser, agora pela lacuna da Lei, afastada dos atos da vida civil.
O tema demandará, ainda, análise pelos operadores do Direito para que possamos dirimir as dúvidas e envidar todos os esforços para que a autonomia da pessoa com deficiência seja confirmada no nosso dia-a-dia, mas com a segurança necessária de que a Lei não retirará direitos, mas vai confirmá-los.
Conheça a autora:
Viviane Limongi,
Advogada.
Graduada, especializada em Direito Empresarial e Mestre em Direito Civil pela PUC/SP.
Doutoranda em Direito Civil pela USP.
Responsável pela área de direito privado do Escritório Limongi Sociedade de Advogados (www.limongi.adv.br)
Vice-Presidente da Comissão de Relações Institucionais com os Tribunais pela OAB/SP Subseção Pinheiros.
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